Como bem sabemos, com o final da licença de maternidade ou mesmo das férias, chega aquele friozinho na barriga face ao facto de termos de deixar pela primeira vez ou novamente, os nossos pequeninos tão preciosos nas mãos de outras pessoas, às vezes por nós desconhecidas! E aquela sensação de abandono num sítio novo/ desconhecido (ou não) durante um dia inteiro?!?

As primeiras semanas de Setembro de adaptação ou readaptação são desafiantes emocionalmente tanto para pais, como para os filhos e também para nós, profissionais de educação .

Não é só a responsabilidade das vidas dos filhos de outras pessoas, mas também o cansaço físico e emocional de gerir a ansiedade de todos numa fase de extrema importância, pois uma boa adaptação inicial vai facilitar e agilizar todo o ano letivo e futuras inserções em ambientes diferenciados por parte das crianças (fundamental para as suas aprendizagens e crescimento!).

Assim sendo, enquanto educadores, o que podemos fazer para ajudar bebés, crianças e suas famílias a iniciar esta nova rotina/ regressar à antiga?

  • Muito Importante! Não analisem demais o primeiro dia ou um momento isolado. Ele não será justificativa nem sintoma de ansiedade de separação. Em vez disso, prestem atenção ao comportamento de cada criança e respetivas mudanças nas primeiras semanas após o retorno.

 

O que devemos, então, esperar das crianças pequenas quando elas voltam para a creche?

De acordo com Neal Horen* (2009), diretor da Divisão de Primeira Infância da Universidade de Georgetown, num estudo sobre programas de saúde mental infantil eficazes, uma coisa é certa: os primeiros dias não serão exatamente como eram antes do verão: “Acho que verão uma ampla gama de comportamentos e reações. Algumas crianças terão muita ansiedade em voltar e podem comunicar esses sentimentos de várias maneiras diferentes. Os professores e educadores precisam estar prontos para isso – a questão é como fazê-lo.”

Antes de irmos ao que realmente interessa, vale a pena reiterar que o que estamos e vamos falar não se aplica a todas as crianças. Algumas ficarão muito felizes em ver os amigos e professores novamente, e outras crianças poderão ficar apreensivas. E está tudo certo… ambas são perfeitamente normais.

Dito isto, vamos ao que aqui nos trouxe!

 

O que é a Ansiedade da Separação?**

A ansiedade da separação é um estágio do desenvolvimento normal. Durante esse estágio, as crianças desenvolvem ansiedade quando são separadas dos seus pais ou cuidadores primários. A ansiedade da separação normalmente começa quando as crianças têm cerca de oito meses de idade e torna-se mais intensa quando as crianças têm entre dez a dezoito meses de idade.

As crianças com 8 a 18 meses de idade ficam, com frequência, assustadas quando encontram pessoas novas ou visitam lugares novos. Quando separadas dos seus pais ou cuidadores, especialmente quando longe de casa, sentem-se ameaçadas e inseguras, procurando nos seus pais/cuidadores segurança e conforto. As crianças dessa idade que choram quando o adulto de referência sai da sua vista, mostra que desenvolveram um senso de apego aos mesmos; o choro nessa situação é uma reação positiva.

A ansiedade da separação continua até as crianças terem cerca de 24 meses de idade. Aí, as crianças aprenderam o conceito de permanência dos objetos e desenvolveram a confiança.

A permanência dos objetos é o conhecimento de que algo (como os pais) continua a existir mesmo quando não pode ser visto ou ouvido, e é quando as crianças compreendem esse fenómeno, que a ansiedade da separação se resolve. As crianças aprendem a confiar que os pais não os vão deixar eternamente.

Em geral, a ansiedade da separação não é motivo de preocupação e não exige avaliação médica.

A ansiedade de separação difere do transtorno de ansiedade de separação, que ocorre em crianças mais velhas. As crianças com esse distúrbio normalmente recusam-se a ir à creche, jardim de infância ou escola. Quando grave, o transtorno de ansiedade de separação pode interferir no desenvolvimento normal da criança.

Os pais não devem limitar ou desistir das suas atividades independentes em resposta à ansiedade da separação de uma criança. Fazer isso, pode interferir com o amadurecimento e o desenvolvimento da criança.

Quando os pais se estão a preparar para sair ou deixar a criança na creche (por exemplo), podem tentar o seguinte:

  • Certificar-se de que na fase de adaptação encontrará sempre o mesmo cuidador (educador ou auxiliar) a receber o seu bebé/criança;
  • Limitar a sua resposta ao choro da criança antes de sair, ou seja, não prolongar a despedida;
  • Permanecer calmos e confortadores em frente ao bebé/criança;
  • Estabelecer rotinas para os momentos de separação para diminuir a ansiedade da criança;
  • Levar um objeto de transição (peluche favorito, fraldinha de pano, etc) que possa ficar com o bebé/ criança na creche;
  • Alimentar ou deixá-la fazer uma sesta antes de sair (porque a ansiedade da separação pode ser pior quando a criança está com fome ou cansada).

Caso a criança chore quando um dos pais vai para outro espaço da casa, deve chamar o nome da criança do outro quarto em vez de, imediatamente, regressar ao quarto para a confortar. Essa resposta ensina a criança que os pais ainda estão presentes, embora ela não consiga vê-los.

A ansiedade de separação que dura além dos dois anos pode ser ou não um problema dependendo do grau de interferência no desenvolvimento da criança. A maioria das crianças, por exemplo, sente algum medo quando começa o jardim de infância, contudo, a ansiedade da separação que impede uma criança de frequentar a escola ou o pré-escolar, ou que ela brinque normalmente com os colegas durante um período mais alargado, ou seja, para além do de transição/adaptação, pode ser um sinal de transtorno de ansiedade de separação. Em tais casos, as crianças devem ser avaliadas por um médico.

 

Quais são os sintomas da ansiedade de separação?

Dependendo da idade das crianças a forma como demonstram os seus sentimentos varia muito. Especialmente quando as crianças retornam à creche depois das férias de verão (ou pela primeira vez), é normal sentirem-se ansiosos.

Mas o que é ansiedade “normal” e quando é que a ansiedade de uma criança se torna motivo de preocupação?

Uma boa maneira de avaliar o comportamento das crianças não é analisar detalhadamente atitudes específicas, mas sim observar como as coisas mudam ao longo do tempo.

Quando nesta situação vale a pena perguntar a si mesmo: quem é esta criança em termos de temperamento? Como se compara o comportamento dela neste período de regresso às aulas ao que observei anteriormente? O que ela gostava, ou não, de fazer?

Nas primeiras semanas a sua equipa (assim como pais/cuidadores) devem ficar atentos a possíveis sintomas de ansiedade da separação nas crianças:

  • Problemas em controlar o temperamento
  • Comportamento regressivo
  • Tristeza depressiva ou falta de interesse em atividades favoritas
  • Mudanças no horário de sono ou de apetite
  • Auto-isolamento, ou desinteresse em circunstâncias sociais
  • Apego anormal em relação a um determinado pai ou cuidador

 

Os três R’s

Lidar com a ansiedade da separação das crianças não é apenas uma solução imediata. É um processo contínuo – temos que planear com antecedência para tornar a transição para fora do ambiente doméstico o mais gradual e suave possível.

Então, o que significa isso em termos de trabalho como educador?

Neal sugere que pensemos nisso em termos de três R’s: relacionamentos, rotina e resiliência.

Vamos decompô-los um por um.

  1. Relacionamentos — Quando as crianças se sentem mais seguras em relacionamentos pessoais, isso dá-lhes uma base segura para explorar o resto do mundo. Faça check-ins pessoais com as famílias, apenas para ver como todos se estão a sair. Se algumas crianças parecem estar com dificuldades, abra espaço para algum tempo de atividade individual com um adulto de preferência. Se ainda estiver numa fase inicial de relação com as famílias remotamente, certifique-se de manter o tempo de atividade virtual para manter esses relacionamentos fortes.
  2. Rotinas — Manter rotinas ajuda a que a creche pareça mais familiar, segura e confiável. Quando as crianças voltarem, reserve um tempo extra para rever as regras da sala juntos e converse sobre as formas pelas quais o dia-a-dia na escola pode ser diferente da vida em casa. Lembre as crianças do calendário diário e coloque-o na parede para que possam estruturar as expectativas do que está por vir.
  3. Resiliência — As crianças precisam da nossa ajuda para aprender a ser resilientes. Na educação, resiliência significa ajudar as crianças a identificar sentimentos difíceis que podem vivenciar, ensinando-lhes habilidades que lhes permitam enfrentar as situações, e mostrar-lhes onde podem ir buscar apoio.

Trabalhar com os pais ou adulto de referência

Apoiar as crianças significa também apoiar os pais. E é provável que os pais estejam a lidar com as suas próprias emoções, uma delas a ansiedade de separação dos próprios filhos também!

Nas primeiras semanas reserve mais tempo do que o normal para manter contato com os membros da família e conhecê-los melhor. Aqui estão algumas maneiras de entrar em contato com os pais para envolvê-los mais na transição para o ambiente escolar:

  • Faça check-ins familiares – Agende reuniões familiares como uma espécie de “questionário” pós-verão. É importante que se pergunte aos pais o que aconteceu em casa diariamente, para que possamos ter uma ideia de que tipo de ambiente caseiro a criança tinha.

Pergunte sobre o que foi realmente bom, o que foi desafiador e como foi o comportamento das crianças em casa, para que possa ajudá-las a se adaptarem melhor.

  • Dê aos pais recursos para usar em casa – Certifique-se de que os pais estão equipados com os recursos necessários para sustentar-se a si mesmos e aos filhos quando estiverem em casa. Considere enviar algumas leituras sobre ansiedade da separação, para que os pais possam manter-se informados também.

Dica ChildDiary: Pode partilhar este artigo com os pais! :)

 

Dicas para aliviar a ansiedade da separação das crianças

Ao preparar o seu “manual” de regresso ao trabalho, aqui estão algumas ideias a ter em consideração para ajudar a prevenir ou aliviar a ansiedade da separação das crianças.

  • Permita que as crianças tragam um objeto de conforto de casa. Um brinquedo não perigoso, um peluche, um cobertor pessoal ou até mesmo uma foto de família podem ser fontes poderosas de conforto para crianças pequenas. Isso vai ajudá-los a sentir que trazem o conforto de casa juntamente com eles, mesmo longe da mesma.
  • Possibilite visitas familiares “fora de horas”. Pode ser especialmente útil para novas famílias, visitar a creche num contexto calmo e sem aglomeração. Podemos ajudar pais e filhos a sentirem o espaço, e ajudar as crianças a se sentirem confortáveis ​​com esse novo ambiente. Também pode ser uma espécie de tour em vídeo, se for mais prático.
  • Deixe os pais ficarem por um longo adeus. Às vezes, pode ser útil para crianças ansiosas que os pais fiquem com elas durante a primeira meia hora do dia. Mas certifique-se de que a criança saiba quanto tempo os pais podem ficar e cumpra esse prazo, para que as crianças possam ajustar as suas próprias expectativas.
  • Concentre-se em ter rotinas consistentes e envolventes pela manhã. Estas são especialmente importantes pela manhã, logo após uma queda potencialmente emocional.

 

Comunique, comunique, comunique…só assim conseguimos ENVOLVER!

Por último e não menos importante quando falamos em transição casa-creche é a questão do envolvimento das famílias na educação dos seus filhos. Ora, para que isto possa acontecer de forma harmoniosa e colaborativa entre educadores e pais ao longo de todo o ano letivo há algo que não pode mesmo ser descurado: a COMUNICAÇÃO.

A comunicação é na fase inicial de transição tremendamente fundamental para o estabelecimento de uma relação de confiança entre os agentes educativos da criança. Sem esta confiança não haverá colaboração nem envolvimento.

Assim, algumas dicas para uma comunicação ASSERTIVA, CLARA, EMPÁTICA e EFICIENTE, sugerimos:

  • Partilhe questionários de preenchimento anónimo com as famílias ao longo de todo o ano, para que possam de forma totalmente anónima colocar os seus medos, receios, expectativas e desejos;
  • Disponibilize um horário mensal para “atendimento” aos pais que podem solicitá-lo em qualquer altura do ano;
  • Deixe-os entrar na sua sala nas primeiras semanas. Convide-os a sentarem-se um pouco ao final do dia numa área da sala a brincar com os filhos e outras crianças presentes;
  • Faça questão de que nas primeiras semanas haverá sempre um dos adultos da sala a receber e a entregar a criança aos pais;
  • Use a ChildDiary para partilhar fotografias do bebé/criança com regularidade (tanto em grupo como individuais);
  • Use a ChildDiary para envolver os pais no portfólio dos filhos e partilhe com eles as evidências de aprendizagem ao longo de todo o ano letivo;
  • Use a ChildDiary para enviar e receber mensagens em privado ou em grupo, mas sem descurar a sua privacidade e tempo pessoal;
  • Use a ChildDiary para poupar tempo no registo das rotinas diárias e assim dar a conhecer em detalhe aos pais quais as rotinas de higiene, sono e alimentação, que tanto preocupam os pais de crianças pequenas na fase de adaptação.

Dica ChildDiary: Nos primeiros dias, envie uma fotografia do bebé/criança em plena brincadeira ou interação para os pais e tranquilize-os, principalmente naqueles dias em que saíram da creche de coração apertado!

 

* Duran, F. Hepburn, K., Irvine, M., Kaufmann, R. Anthony, B., Horen, N., & Perry, D. (2009). What Works?: A Study of Effective Early Childhood Mental Health Consultation Programs. Washington, DC: Georgetown University Center for Child and Human Development.

** Baseado em:
Consolini, D., (2020). Ansiedade da separação e ansiedade do desconhecido. retirado do site [https://www.msdmanuals.com/pt-pt/profissional]
Marques, F. (2021). Como lidar com a ansiedade da separação. retirado do site: [https://www.medis.pt/mais-medis/gravidez-e-saude-infantil/como-lidar-com-a-ansiedade-da-separacao/]

 

Patrícia Nogueira

Educadora de Infância e Sales Manager

Pergunte-nos como a ChildDiary Funciona!